Capítulo 6
Eu ainda não tinha uma explicação lógica para tudo que vinha
acontecendo. A revolta de Flávia, as coisas que ela havia dito sobre
Fernando, sua frase final ‘Pergunte ao seu namorado’. Foi algo tão...
insinuante e atormentador.
Eu estava no meu quarto, encarando o teto
cor pêssego. Reparei em suas rachaduras, em algumas partes descascadas
dele... Tentava me distrair de todos aqueles pensamentos absortos que me
consumiam, e que definitivamente não me levariam a nada.
Afinal, era
sábado, e sábado é um dia para se ter a cabeça fria e apenas curtir os
pequenos momentos sem ter que calcular nada ou qualquer outra coisa que
envolva escola. E neste sábado eu teria um encontro com Benjamin. Eu não
estava nervosa como antes, na verdade não via a hora de encontrá-lo e
fazer o que Flávia havia dito. Ouvi algumas batidas na porta de madeira
do meu quarto e vi Meredith se aproximar com uma bandeja. Ela a
depositou sobre minha cama e foi abrir as cortinas das persianas.
Sentei-me e puxei a bandeja para mais perto, pegando as torradas e
passando geléia de amora sobre elas.
“Rise and shine, Luinha”
Meredith disse incrivelmente animada, e eu fiquei me perguntando como
alguém pode ser tão bem humorada de manhã. Não disse nada, só continuei
concentrada em meu café da manhã. Os únicos momentos do dia em que minha
cabeça fica completamente vazia é quando estou comendo, algo muito
estranho para falar a verdade.v “Termine seu café e vista-se. Você tem
treino de tênis hoje com seu pai, e Mel ligou dizendo que também irá”
Mere anunciou e saiu do quarto. Terminei de comer calmamente e me
levantei da cama com muito desgosto, indo em direção ao meu closet
pegando meu uniforme de tênis e o vestindo.
Era rotina, todo sábado
eu e meu pai íamos ao clube local praticar tênis por diversão. Eu
particularmente adorava, meus problemas desapareciam e minha raiva
esvaziava toda hora que aquela pequena bola amarela batia contra minha
raquete.
O motorista no levou até o clube, onde eu e meu pai
fomos direto às quadras de tênis, conversando sobre novas técnicas de
aprimoramento no esporte. Melzinha já estava à nossa espera, eu jogaria
com ela e meu pai jogaria com seus amigos multimilionários. Cumprimentei
minha amiga com um abraço e começamos a nos preparar. Eu estava com o
saque inicial, entao não tardei a lançar a bola em direção à Melzinha. O
som de Ray Charles invadiu todos os campos, como sempre a musica no
tênis do clube Itacolomy era indispensável.
Melzinha rebateu a bola
para meu campo, e a imagem de Flávia veio em minha cabeça, me dando um
impulso a rebater fortemente a bola contra o campo adversário.
“FORA!” gritou o juiz do nosso jogo, e eu limpei uma gota de suor que escorreu sobre minha face.
“Isso tudo é raiva, Luinha?” Melzinha gritou do outro lado do campo e eu saquei novamente.
“Não
é raiva” rebati. “Na verdade não sei o que é. Eu só não consegui
entender o comportamento ridículo de Flávia” rebati novamente.
“Já te disse, ela deve estar se drogando com essas coisas novas que andam aparecendo” ela rebateu.
“Isso realmente não justifica, Melzinha” rebati fortemente.
“FORA!”
o juiz gritou novamente e tive vontade de jogar a bola em sua cara.
“Ponto para Mel” anunciou. Melzinha levantou a raquete assim como a bola
e sacou.
“E hoje vou sair com Suede. Espero que ele tenha uma
resposta para isso tudo. Apesar de eu não ver conexão entre os fatos”
rebati.
“Você vai me machucar, Lua” Melzinha reclamou com a força que
eu estava mandando a bola. Meu pai já era acostumado com os meus
acessos de raiva, Melzinha teria que acostumar também. Era isso, ou ter
que agüentar murros e chutes. Acho que ela iria preferir o tênis.
“Desculpa...” balancei minha cabeça tentando espantar aquela raiva que me perseguia.
“Olha
Luinha, o único jeito de você ter respostas é falando com Benjamin.
Remoer isso não vai adiantar de nada!” disse Mel, a sabia. Concordei e
tentei não pensar em mais nada e me concentrar no meu esporte favorito, o
único jeito que realmente me relaxava e me fazia esquecer do mundo à
minha volta.
“Okay, te ligo mais tarde...” despedi-me de Melzinha,
que havia ligado para que seu motorista a pegasse, já que ela tinha um
importante jantar de família comemorando o aniversário de 95 anos de sua
bisavó.
Resolvi ficar por ali mais um tempo, aquele clube me
acalmava. Papai ainda jogava, e se eu estivesse com ele, provavelmente
também estaria, mas Melzinha não tem o mesmo pique que nós dois. Então
resolvi nadar na piscina gigante que tinha ali. Eu também gostava de
prticar natação, peguei habito desde quando tive uma crise asmática nos
meus 5 ou 6 anos…
Fui até o vestiário, coloquei minha roupa de banho e
rumei às piscinas gigantes. Sem rodeios, pulei de ponta, sentindo a
água fria como um choque em contato à minha pele quente. Comecei a nadar
e nadar, ignorando a presença de qualquer pessoa ao meu redor. Piscina
me faz lembrar de minha infância, quando eu, Melzinha e Flávia
costumávamos brincar, imaginando que éramos sereias, e cada uma tinha o
direito de escolher a cor da cauda, top e cabelos. Eu e Flávia sempre
brigávamos para ter a cauda rosa. Fui mergulhando até a borda lateral da
piscina e fui nadando lentamente até a superfície, apoiando meus braços
na borda para subir.
Assim que minha cabeça saiu da água, vi alguém
sentado com as pernas para dentro da piscina, ali, bem perto de mim.
Levei um susto ao ver que essa pessoa era Fernando, e que ele estava me
encarando descaradamente.
“H-Hey...” cumprimentei-o nervosa antes de dar um impulso para sair da piscina.
“Oi
Luinha...” ele sorriu e me acompanhou com o olhar até eu pegar minha
toalha na espreguiçadeira ali perto. Resolvi me sentar ali ao lado de
Fernando, também com as pernas dentro da água.
Houve um silencio meio
incomodo entre nós, eu olhava para o movimento das pessoas ali por
perto, as crianças brincando animadamente na parte mais rasa da piscina,
enquanto eu sentia os olhos de Fernando sobre mim. Eu tentava puxar
minha saia mais para baixo, envergonhada. Eu tinha a absoluta certeza de
que minhas bochechas estavam coradas de um jeito ridículo. Era
estranho, eu me sentia estranha perto do garoto ao meu lado. Não
estranha de um jeito ruim, mas de um jeito bom, se é que isso existe.
Olhei-o pelo canto do olho, e foi só ai que reparei em seus trajes, ou a
falta deles. Fernando usava apenas um calção que ia um pouco acima do
joelho, e vi que seus cabelos estavam molhados e totalmente
desarrumados, alguns fios estavam grudados em sua testa, respingando
água pelo seu rosto. Meus olhos ficaram um pouco hipnotizados demais com
a cena, até que vi um sorriso brotar nos lábios do garoto, e eu cair na
realidade novamente, sentindo mais uma vez, minhas maçãs do rosto
queimarem. “E-Então...” falei totalmente sem jeito, contraindo meu corpo
de vergonha e tentando olhar para qualquer canto que não fosse os olhos
(ou o corpo definido) do Roncato. Me senti extremamente promiscua com
todos os pensamentos que rondavam meu cérebro.
“Então...” ele repetiu
e jogou o peso de seu corpo para trás, apoiando-o sobre as mãos, tendo
uma visão das minhas costas, o que novamente me deixou extremamente sem
graça. Eu comecei a ficar realmente incomodada comigo mesma, pelo fato
de não conseguir fazer o sangue concentrado nas minhas bochechas descer.
Era uma vergonha constante e que não e deixava em paz. Acho que eu
nunca havia ficado assim na presença de Fernando... Quero dizer... Ele é
o Fernando! Porque diabos eu tinha que ficar envergonhada perto dele?
“O
que está fazendo por aqui?” perguntei, quebrando aquele silencio
extremamente constrangedor. Vi Fernando se espreguiçar e bocejar antes
de me responder.
“Lá em casa tava um tédio, e nenhum dos meninos
queria treinar hoje, entao resolvi vim jogar uma sinuca... Nadar...” ele
respondeu distraído, olhando para as pessoas por ali, com seus olhos
apertados a fim de protegê-los do sol. Ele ficou ainda mais... Lindo.
Balancei minha cabeça, tentando espantar novamente os pensamentos nada
amigáveis que insistiam em me perseguir.
“Andam escrevendo muitas musicas?” puxei mais assunto, a fim de me distrair.
“Oh
sim. Eu ‘to começando a escrever essa, Get Over You... Mas ela ainda tá
picada, só tenho o refrão...” Fernando disse casualmente.
“Canta ela pra mim!” falei normalmente, encarando-o. Ele me olhou assustado e negou com a cabeça freneticamente.
“De jeito nenhum!” ele se adiantou, agora fazendo gestos exagerados com a mão.
“Hey,
por que não? Vergonha é? Como você pretende cantar na frente de
milhares de pessoas quando ficar famoso?” fingi-me de brava.
“Não é
vergonha é que...” ele parou subitamente de falar e encarou as mãos.
“Okay, eu canto. Mas só a parte que escrevi!” concordei com a cabeça e
ele fechou os olhos.
“Cuz you’ve got all the things that I want
and I just can’t explain so
Help me baby I gotta get over you
And now and then she looks in my direction,
Im hoping for a sign of her affection but shes in denile and,
Shes got some worries today
But I think if she'd give me a chance,
I'll pleasantly surprize but,
Help me babe I gotta get over you…”
A
voz de Fernando era tão perfeita que eu viajava enquanto ele cantava.
Era algo de outro mundo escutá-lo cantar. Se eu pudesse, passaria o dia
escutando qualquer porcaria que ele quisesse cantar. Qualquer porcaria
se tornaria perfeição.
“Bom... É isso!” ele disse sem graça, dando
de ombros. Eu ainda estava estática, sem palavras para expressar o que
eu sentia. Quero dizer, aquela letra me tocou de alguma forma que eu não
podia explicar, e eu simplesmente não poderia dizer o quão magnífico
era escutá-lo cantar, afinal, aquilo soaria estranho.
“Está ficando
muito boa! Quero escutá-la completa depois...” falei sorrindo sem graça e
voltando minha atenção às crianças barulhentas ali. Senti seus olhos
pousarem sobre mim, e pelo canto do olho vi que ele sorria.
Olhei-o novamente, disfarçando o máximo possível, apesar de não ser boa nisso. Ele continuava a me encarar.
“O
que foi?” perguntei incomodada. Talvez eu estivesse com uma sujeira em
algum lugar, ou meu cabelo estava ridicularmente estranho... Fernando
soltou um risinho e voltou a se sentar normalmente.
“Não é nada... É só que lembrei de algo” ele disse ainda rindo, o que me fez ficar mais intrigada.
“Anda, fala logo!” comecei a rir também, mas só pelo fato de estar escutando a risada dele.
“Você
nada de um jeito engraçado...” Fernando disse rindo explosivamente. Fiz
uma cara de choque e minha mão foi em direção ao seu ombro em um tapa.
“Não
tem nada de engraçado, okay Roncato? Eu nado desde os cinco anos, sou
quase uma profissional!” falei brava, e nada fazia aquele garoto parar
de rir.
“Você parece um sapo, ou algo do tipo...” ele disse, já se
contraindo pois sabia que eu iria o estapear. E foi o que eu fiz. “HEY,
HEY, EU NÃO TENHO CULPA, OKAY?” continuou ele, rindo. Bufei e decidi
ignorá-lo, colocando minhas pernas novamente na água e olhando para
frente.
“Engraçado não é sinônimo de feio...” Fernando veio em minha
direção, também colocando os pés dentro da piscina. Continuei a
ignorá-lo. “Porque isso seria totalmente impossível...” ele disse mais
baixinho, mas eu pude ouvir e virei para encará-lo. Ele parecia
envergonhado, já que começou a bagunçar os cabelos freneticamente.
“Quero dizer... Nada em você é... Você sabe... Feio...” Fernando já não
olhava para mim. Brincava com o cordão de seu calção, e eu vi o quão
nervoso ele estava. Um sorriso involuntário apareceu no meu rosto. “Nada
que você faz... Enfim... Er... Nada.. terminou ele com pressa. ‘Como
alguém pode gostar de você? Só algum idiota como o Roncato’
“Obrigada...” falei tão sem graça quanto Fernando e comecei a encarar meus pés desfigurados na água.
“Lua?” escutei alguém me chamar de longe, e eu e Fernando nos viramos para ver quem era.
“Sim, papai?” respondi John, que estava atrás de uma cerca que separava a piscina do resto do clube.
“Está
ficando tarde, acho melhor irmos...” ele disse e eu o obedeci. Me
levantei, enrolando a toalha no meu corpo e calçando meu par de chinelos
que estava ali perto. Para minha surpresa, Fernando se levantou junto, e
pegou minha bolsa (um tanto quanto grande, já que minhas roupas e
outras coisas estavam lá dentro) e meu case da raquete na
espreguiçadeira, e me acompanhou até onde meu pai estava.
“Senhor Blanco...” Fernando o cumprimentou com um aperto de mão, e meu pai abriu um sorriso.
“Hey
pequeno Roncato, como está seu pai?” John perguntou e me lembrei que
ele e o pai de Fernando eram grandes amigos. Meu pai sempre freqüentava o
bar dele.
“Está bem, de vez em quando reclama que o senhor não anda
mais indo lá no bar” Fernando respondeu e os dois começaram a conversar
animadamente sobre o bar, e o pai de Fernando, e eu totalmente absorta
no assunto. Deixei os dois ali e fui me trocar, colocando minha roupa
suada que antes usei para jogar tênis.
“Bom te ver, Fernando. Mande
um abraço para o velho Roncato e diga que amanhã darei uma passada lá!”
meu pai deu alguns tapinhas nas costas do garoto e pegou minhas coisas
com ele. Eu esqueci totalmente que ele as carregava e que só o case da
minha raquete pesava no mínimo dois quilos. “Pode deixar, senhor
Blanco!” Fernando sorriu e meu pai começou a andar na minha frente, me
deixando sozinha com o ‘pequeno Roncato’.
Eu ainda estava
envergonhada, não olhava diretamente para Fernando, e sim para os meus
pés. Percebi entao, que o sol finalmente começava a se pôr, deixando o
céu em um tom alaranjado, e os mínimos raios que ele ainda lançava,
tocavam o rosto de Fernando realçando seus olhos de um jeito incrível.
“Bom... Até mais então, Luinha...” ele disse com um sorriso lindo.
“Até...”
falei distraída, olhando hipnotizada para seus olhos, que estavam ainda
mais claros pela luz fraca que batia em seu rosto. Ele sustentou meu
olhar, deixando cada vez mais difícil a minha partida. Balancei minha
cabeça negativamente e me aproximei mais do garoto. Coloquei as duas
mãos em seu ombro e me estiquei na ponta dos meus pés para alcançar sua
bochecha, depositando ali um leve beijo. Não sei o que me levou a fazer
isso, impulso... Não sei... Só sei que vi suas bochechas ficarem muito
vermelhas, e as minhas não estavam diferentes. Olhei para os meus
próprios pés, e comecei a mexer com os pés algumas pedrinhas ali no
chão.
“Bom... Adeus...” falei baixinho, ainda sem olhar diretamente para Fernando.
“A-Adeus...” ele falou finalmente, com dificuldade.
Sorri envergonhada e dei as costas, correndo em direção ao meu pai que estava à alguns metros de distancia.
Continua...
Está web é simplesmente ÓTIMA.. Cada cap que passa ficando mais apaixonada.. Cara, vc escreve bem, muito bem por sinal! Simplesmente AMANDO cada cap.. Parabéns!!
ResponderExcluirA Carlinha escrevi bem mesmo :)
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